quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

CRIAÇÃO DE NOVO PARTIDO POLÍTICO COMO JUSTA CAUSA PARA DESFILIAÇÃO


Introdução.
Em outubro de 2007, o Tribunal Superior Eleitoral editou a resolução 22.610 que regulamentou os processos de perda de cargo eletivo e de justificação para os casos de desfiliação partidária. A norma emanada pela Corte Superior Eleitoral surgiu para integrar a lacunosa legislação ordinária, a fim de atender o decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604.
Coube ao Tribunal Superior Eleitoral disciplinar as hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária que autorizariam o detentor de mandato permanecer no exercício do cargo eletivo, mesmo após a desfiliação.
A regra, portanto, indica que o mandato pertence ao partido, que poderá recorrer ao Poder Judiciário para obter a posse do suplente imediato na vaga do filiado “infiel”. As exceções estão previstas no § 1º do artigo 1º da resolução TSE 22.610 (alguns doutrinadores defendem que as hipóteses previstas na resolução são meramente exemplificativas):
 i) incorporação ou fusão do partido; 
 ii) criação de novo partido;
 iii) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;
 iv) grave discriminação pessoal.

A criação de um novo partido.
O sistema partidário previsto na Constituição Federal de 1988 é o pluripartidarismo, inexistindo qualquer restrição à criação de novas agremiações partidárias, desde que respeitados os preceitos constitucionais e os requisitos previstos na lei dos partidos políticos (lei 9096/95).
Em síntese, a lei orgânica dos partidos políticos divide a criação de um novo partido em duas etapas:
i) a anotação no registro civil das pessoas jurídicas (artigo 8º) e
ii) registro do estatuto junto ao Tribunal Superior Eleitoral (artigo 9º). Sem dúvida alguma, a criação de um partido político não é tarefa das mais fáceis, principalmente diante da exigência legal de prova de “apoiamento de eleitores correspondente a, pelo menos, meio por cento dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de um décimo por cento do eleitorado que haja votado em cada um deles”. (artigo 7º da lei 9.096/95).
Entretanto, diante da nova interpretação jurisprudencial que trouxe a grave consequência de perda do cargo eletivo no caso de desfiliação partidária injustificada, a tarefa de criação de um novo partido, apesar de árdua, poderá trazer poderosos dividendos políticos aos líderes dessa nova agremiação.

Criação de um novo partido. Justa causa objetiva.
Dentre as hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária, verifica-se que algumas demandam uma análise subjetiva da Justiça Eleitoral, como a grave discriminação pessoal e mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário.
Por outro lado, a criação de um novo partido não permite a incidência de subjetividade por parte do julgador. Ocorrendo a desfiliação partidária para ingresso nos quadros de um novo partido, restará protegido o direito ao exercício do cargo eletivo.
Assim, com a garantia de exercício pleno do mandato eletivo em essa nova agremiação, a migração para a nova legenda se torna ainda mais atrativa para o político insatisfeito.

Aspectos práticos para a filiação ao novo partido.
Algumas dúvidas começaram a surgir dentre os políticos que pretendem ingressar em um novo partido sem o risco de perderem seus cargos eletivos.
A primeira indagação que surge se refere à suposta “desfiliação automática”, em caso de declaração de apoio à criação de novo partido ou subscrição como fundador dessa nova agremiação.
A jurisprudência do TSE sempre consignou a inexistência de incompatibilidade entre uma filiação partidária e a assinatura em registro de criação de novo partido. A filiação ao segundo partido somente pode ocorrer após o registro do seu estatuto no TSE.
Assim já decidiu o TSE:

“(...) o registro de um novo partido no Cartório de Registro Civil não implica a desfiliação automática dos fundadores dessa nova agremiação, que continuam vinculados a seus partidos de origem, até que se efetive o registro do estatuto do novo partido no TSE. A filiação partidária, pois, inicia-se com a chancela da Justiça Eleitoral, quando o novo partido estiver definitivamente constituído.” (Pet 3.019/DF, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe de 13.9.2010)
Em 02 de junho de 2011, o Tribunal Superior Eleitoral respondeu a Consulta 755-35 DF, esclarecendo detalhadamente o tema:
“A adesão inicial de eleitores à criação de partidos políticos não só é permitida como necessária à formação do partido. No entanto, ela se dá apenas com os fundadores – subscritores do requerimento do registro do partido no Registro Civil das Pessoas Jurídicas da Capital Federal – e apoiadores – eleitorado em geral.
A filiação partidária ocorre após o registro do estatuto no TSE e deve ser formalizada pelo interessado junto ao partido, independentemente de manifestação anterior, haja vista que a filiação não pode ser presumida, por constituir ato de vontade.
Com efeito, o ato de filiação partidária é ato processual eleitoral formal e depende de manifestação expressa. Além disso, a lei prevê – para aqueles que pretendem ser candidatos – um tempo certo para o seu requerimento.
Assim, qualquer ato de subscrição antes do registro do estatuto pelo TSE não pode ser considerado como filiação partidária.
Ademais, não há filiação partidária por presunção ou interpretação analógica. A respeito, confira-se os artigos 16 a 18 da Lei 9.096/95.”
Outra questão prática que necessitava de regulamentação dizia respeito à fixação de um prazo razoável para ingresso de adeptos ao novo partido, resguardado o exercício do cargo eletivo daqueles que migraram de agremiação.
Invocando uma interpretação analógica com o artigo 9º, § 4º da lei 9.096/95, o TSE na referida Consulta 755-35 estabeleceu que, para se reconhecer a justa causa, o prazo razoável para filiação à nova legenda é de 30 dias após o registro no TSE:
“Para o reconhecimento da justa causa para desfiliação partidária, deve haver um prazo razoável entre o fato e o pedido de reconhecimento, de modo a evitar um quadro de insegurança jurídica, por meio do qual se chancelaria a troca de partido a qualquer tempo.
Nesse sentido:
RECURSO ORDINÁRIO. FIDELIDADE PARTIDÁRIA. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA. FATO OCORRIDO HÁ MAIS DE DEZ MESES. RECURSO PROVIDO.
1. Para o reconhecimento das hipóteses previstas na Resolução 22.610/2006-TSE deve haver um prazo razoável entre o fato e o pedido de reconhecimento da justa causa. (...)
3. Recurso provido. (RO 2352/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 18/11/2009).
Desse modo, para aqueles que contribuíram para a criação do novo partido, é razoável aplicar analogicamente o prazo de 30 dias, previsto no art. 9º, § 4º, da Lei 9.096/95, a contar da data do registro do estatuto pelo TSE.
Assim, o prazo razoável para a filiação no novo partido é de 30 dias contados do registro do estatuto partidário pelo TSE.”
Lembre-se que para se desfiliar do antigo partido político o candidato deverá comunicar ao partido político e ao Juízo da Zona Eleitoral, sob pena de caracterizar a dupla filiação, com o cancelamento de ambas anotações.
Conclusão.
A criação de um novo partido político é a “janela” esperada por muitos políticos de diversas tendências ideológicas. A explicação é simples. Em toda associação de pessoas existem insatisfeitos. Em alguns grupos o número é maior, em outros poderá ser menor, mas a insatisfação, a ansiedade e a expectativa eleitoral da classe política estarão sempre presentes em qualquer sociedade.
Assim, com um pouco de organicidade e liderança, um novo partido político poderá arrebanhar adeptos das mais diversas origens, o que, indubitavelmente, gerará insatisfação naqueles grupos que se enfraquecem. Exemplo recente é a notícia de que um partido em formação poderá se tornar, imediatamente, a terceira maior bancada na Câmara dos Deputados.
Nessa linha de raciocínio, observado o histórico pragmatismo do legislador eleitoral, conclui-se que outras “janelas” para o troca-troca partidário poderão surgir, em breve, no Congresso Nacional, protegendo os interesses dos atuais partidos políticos, pois, caso contrário, um novo partido poderá ser a única “salvação” de muitos insatisfeitos.
Por Eduardo Damian Duarte

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