terça-feira, 17 de setembro de 2013

VEJA O PARECER DA AÇÃO 42.586


EXMO. JUIZ DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO CEARÁ
PROCESSO Nº 425-86.2012.6.06.0048
RECORRENTE:      DANIELA  HELENA DE SOUSA MELO
RECORRIDOS:   GONÇALO SOUTO DIOGO e CARLOS SÉRGIO DE BRITO
PARECER Nº 17.235/2013
Recurso Eleitoral. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Eleições majoritárias de 2012. Captação ilícita de sufrágio. Inidoneidade das provas. Acervo probatório inconsistente. Parecer pelo improvimento.
O Ministério Público Eleitoral, pelo Procurador Regional Eleitoral, comparece ante Vossa Excelência para apresentar PARECER nos autos do processo em epígrafe, o que faz com base nas razões de fato e de direito a seguir expostas:
1. SINOPSE FÁTICA
1.1. Trata-se de Recurso Eleitoral interposto por Daniela Helena de Sousa Melo em virtude da insatisfação com a decisão prolatada pelo Juízo Eleitoral da 48ª Zona (Nova Russas/CE), o qual julgou improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral por antever um conjunto probatório inidôneo para servir de sustentação de decreto condenatório proferido nos termos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
1.2. A recorrente sustenta a viabilidade jurídica da reforma da decisão uma vez que o lastro probatório dos autos autoriza indubitavelmente a subsunção dos fatos expostos na inicial à previsão de captação ilícita de sufrágio.
1.3. Nas contrarrazões, os recorridos pugnam pela manutenção da decisão. Preliminarmente, esposam a tese de que o recurso eleitoral não merece ser conhecido por absoluta falta dos pressupostos recursais – ausência de interesse e de regularidade formal do recurso eleitoral. No mérito, sustentam o improvimento do recurso por ausência de tessitura probatória convincente da prática de captação ilícita de sufrágio.
1.4. É o relatório. Vieram os autos com vista ao Ministério Público Eleitoral. Passo a me manifestar.
2. RAZÕES DE DIREITO
2.1. DA TEMPESTIVIDADE
2.1.1. Vê-se aqui a tempestividade do presente recurso, uma vez que a ciência da decisão deu-se em 25/06/2013, conforme consta à fl. 130-v, enquanto que a interposição do recurso deu-se no dia 28/06/2013, portanto, dentro do prazo legal previsto no art. 258 do CE.
2.2. DA PRELIMINAR
2.2.1. Não vislumbramos que o âmbito preliminar seja ocasião apropriada para a discussão das apontadas irregularidades - pressupostos recursais, bem como de interesse recursal e da regularidade formal do recurso eleitoral – , uma vez que elas se confundem com o próprio mérito da ação.
2.2.2. Passemos então à análise do mérito.
3.2. DO MÉRITO
3.2.1. Temos que a ora recorrente aforara Ação de Investigação Judicial Eleitoral contra os ora recorridos visando obter a cassação de seus registros ou mandatos, sob a tese argumentativa de que os ora recorridos comprometeram o equilíbrio da disputa eleitoral por haverem incidido na prática de captação ilícita de votos, nos termos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
3.2.2. Na narrativa inicial, está configurado que, durante o processo eleitoral de 2012, os concorrentes, no caso, os ora recorridos, Gonçalo Souto Diogo e Carlos Sérgio de Brito, candidatos ao cargo de prefeito e vice-prefeito, respectivamente, corromperam, diretamente ou por meio de seus apoiadores, aqueles eleitores mais humildes a fim de obterem seus votos ou de se absterem de votar nos  candidatos adversários.
3.2.3. Em breve apanhado dos fatos, temos que a representação apoiada numa reprodução de diálogos, captados por via de gravação (DVD), a qual fora procedida de forma clandestina, ocorrido após as eleições de 2012, na qual se tem o registro de que a Senhora SOCORRO, moradora do distrito Canindezinho, asseverou que seus filhos, sem o seu conhecimento, venderam os seus votos aos então demandados. Também registra que a Senhora SIMONE, residente no mesmo distrito, afirmou que vira, em determinado estabelecimento comercial, vários títulos eleitorais despejados sobre o balcão. E ainda há a afirmação de WALACE AZEVEDO DO NASCIMENTO, residente na localidade de Vila França, de que os então demandados compraram o seu voto.
3.2.4. Nos depoimentos colhidos em Juízo, consta que o Senhor MATIAS DE SOUSA SIMEÃO negou qualquer conhecimento de compra de votos, bem como a compra do voto da Senhora JARINA PEREIRA (fls. 68/69). Tem-se que a Senhora SIMONE ROSA FERREIRA afirmou que viu alguns títulos, em torno de 05 (cinco), em cima do balcão do estabelecimento comercial da Senhora ANA, além disso fez constar que nunca presenciou a compra de votos por parte dessa senhora, apenas ouviu falar, mas não sabe quem falara. Informou, ainda, que um tal de “BIDA”, o qual já trabalhou na cerâmica da Senhora ANA, indagara ao seu esposo se queria dois pneus de moto para votar no Senhor GONÇALO. Não sabendo, contudo, do paradeiro desse senhor. E, por último, disse que a ANA, mais o seu pai, COSTINHA, e o seu esposo, MATOS, participaram ativamente da campanha dos ora recorridos (fls. 70/71). Enfim, O Senhor JOSÉ DE ALENCAR DO NASCIMENTO disse não ter tido conhecimento de que os aqui recorridos tenham promovido a compra de votos (fl. 72).
3.2.5. É de bom alvitre ressaltarmos a observação feita pelo Juiz Eleitoral, quando da prolação da sentença, de que o protagonista de todas as gravações foi o Senhor ARETON, o qual, por diversas ocasiões, envolvera-se em conflitos pertinentes à campanha eleitoral de 2012, tendo, inclusive, formalizado reclamações as quais foram consideradas improcedentes por falta de provas, o que lhe acarretou algumas representações. Daí, em face do insucesso, após as eleições, arregimentou-se de provas obtidas através da participação de eleitores humildes, vinculados, de alguma forma, a ele e à sua família.
3.2.6. Destacou, ainda, o Magistrado, que das testemunhas ouvidas em Juízo, uma parte demonstrara haver ligação com um dos então promoventes, no caso, o Senhor LUÍS ACÁCIO DE SOUSA; enquanto a outra, negara a participação nos diálogos apresentados nas gravações.
3.2.7. Sem dúvida, há nos autos procedentes indícios que infirmam a veracidade das versões apresentadas sobre a compra de votos, uma vez que restou demonstrado o vínculo de comprometimento entre as testemunhas e um dos promoventes (ou sectários), é o caso da Senhora MARIA DO SOCORRO com o Senhor LUÍS ACÁSIO DE SOUSA, coautor da ação, e a do Senhor WALLACE AZEVEDO DO NASCIMENTO, o qual afirmara haver vendido o seu voto ao Senhor GONÇALO, com o Senhor ARETON, então fervoroso adepto da campanha eleitoral da Senhora DANIELA e arquiteto da estrutura probatória dos autos.
3.2.8. O Senhor WALLACE, além de seu irmão estar vinculado ao Senhor ARETON através de relação empregatícia (morador), demonstrara nos autos a sua insatisfação com a vitória do então candidato concorrente, o Senhor GONÇALO, conforme faz constar à fl. 76.
3.2.9. A senhora MARIA DO SOCORRO manteve por muito tempo, por mais de 15 (quinze) anos, relação de emprego (na condição de moradora) com o Senhor LUÍS ACÁSIO DE SOUSA, e, por intermediação deste, fora beneficiada pela obtenção de casa própria através do programa do Governo Federal (fl. 76).

3.2.10. O estado de insatisfação que deixa transparecer sentimento de animosidade, tão quão a condição de dependência econômica proveniente da relação de emprego, não pode ser encarada como mera preferência política. É, na verdade, circunstância que por si só estremece a imparcialidade dos depoimentos, uma vez que se constitui um fator que evidencia o interesse das testemunhas no deslinde da causa em favor da ora recorrente.
3.2.11. Quadra-se, portanto, no caso típico de suspeição, nos termos do inciso IV, § 3º, art. 405 do Código de Processo Civil.
3.2.12. O entendimento jurisprudencial[1] é de que a gravação de conversa, seja ambiental seja telefônica, realizada por um dos interlocutores, ainda que insciente o outro, é considerada prova lícita.
3.2.13. No caso aqui em discussão, embora não possamos afirmar peremptoriamente a ilicitude das provas, as declarações informais contidas na gravação não repassam a segurança necessária à conclusão do fato imputado aos ora recorridos. Tem-se no máximo meros indícios pontuais. O que impossibilita o decreto condenatório[2].

3.2.14. No mais. A gravação de áudio/vídeo, cuja produção ficou a cargo de simpatizantes da campanha da autora da ação, os quais eivados de sentimento político-partidário, despojados, portanto, de imparcialidade, carece de legitimidade necessária para fundamentar uma decisão condenatória.
3.2.15. Na verdade, além das gravações serem desprovidas da idoneidade necessária, não há como subtrair da prova testemunhal nenhuma fagulha sequer de firmeza dos fatos alegados na inicial. É o que se pode sentir do depoimento prestado por SIMONE ROSA FERREIRA, no qual se antever circunstância que desnudam mais um enredo (intriga) do que a compra de votos.
3.2.16. Portanto, o contexto probatório testemunhal[3] não é forte e incisivo ao ponto de servir de fundamento ao decreto condenatório por prática de captação ilícita de sufrágio.
3.2.17. E de fato, o que se vê é a pronta pretensão de fazer da via processual um mero instrumento de discussão das picuinhas de disputa eleitoral. É dizer, um instrumento a serviço das conveniências do partido ou candidato, como uma espécie de consolo ante o insucesso nas eleições. De modo que não goza da menor idoneidade jurídica uma pretensão movida apenas pelo sentimento de derrota nas urnas.
4. CONCLUSÃO
4.1. Por tudo quanto posto, opina o Ministério Público Eleitoral pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu não provimento.
Fortaleza-CE, 05 de setembro de 2013.

Rômulo Moreira Conrado
Procurador Regional Eleitoral



[1]A gravação não se confunde com a interceptação telefônica, esta sim sujeita à reserva de jurisdição. A gravação telefônica feita por um dos interlocutores – o vitimizado -, sem autorização judicial, nada tem de ilícita, e pode ser validamente utilizada como elemento processual (STJ. HC 94945. QUINTA TURMA. Rel(a). Min. Laurita Vaz. DJE 23/08/2010).

     A gravação de conversa entre dois interlocutores, feita por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de defesa (STF. AI-AgR 503617. SEGUNDA TURMA. Rel. Min. Carlos Velloso. 01.02.2005)
[2]A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral exige, para caracterização da captação ilícita de sufrágio e consequente julgamento de procedência da representação do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, prova robusta dos atos que a configuram, não sendo bastante, para tanto, meras presunções, especialmente no caso de suposta participação mediata do candidato. Precedentes.
[3]MANDATO – CASSAÇÃO – COMPRA DE VOTOS – PROVA TESTEMUNHAL. A prova testemunhal suficiente à conclusão sobre compra de votos – art. 41-A da Lei nº 9.504/1997 – há de ser estreme de dúvidas (TSE. Respe nº 38277706. Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Farias Mello. DJE 09/11/2011)

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